E naquele dia, o barulho das alparcas batendo na sola dos pés daquele homem caminhando em direção ao lugar da Caveira, levantando poeira e bagunçando a terra solta do chão batido, ensurdeceu-se com a algazarra das vozes gritando "crucifica-o".
Entre atropelos na vozearia de gente escolheram dizer juntos: "O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos."
Enquanto isso, a passos trôpegos, o homem que um dia chamaram desde rei dos judeus a possesso por demônios, continuava sua jornada escrita antes do Éden, subindo a ruela do Gólgota, não de mãos abanando acenando pra qualquer um dos seus admiradores ocultos engolidos pela multidão, mas tocado a base do chicote, carregando na cacunda a madeira, não para fazer mais uma mesa ou cadeira, mas para ser pendurado no alto do morro.
Lhe fizeram uma coroa de espinhos e a puseram em sua cabeça. Lhe amarram uma cana nas mãos e zombaram dele como se rissem de um bufão. Arrancaram-lhe as vestes e cuspiram em seu rosto. Serviram-lhe vinho com fel. Cortaram-no com lança. Deitaram sorte sobre os bocados do seu vestido. Condenado como bandido, o homem que usara suas mãos para enlamear de cuspido os olhos de cegos, agora, com as palmas das mãos abertas, ostentava cravos que o perfuravam para sustentá-lo no alto da cena. Para servir de escárnio e deboche.
O esperado aconteceu. Mais hora menos horas o homem faleceu. Quem quis ouvir ouviu ele chamar Elias. Num desespero de dor, o homem até lamentou o descuido de Deus em não olhar para aquele momento tão sofredor. Quem quis ouvir, ouviu mais ainda quando o homem entregou seu espirito ao Pai. Morreu. Morreu morte de cruz.
Ali, cravado no madeiro, o filho de carpinteiro nascido em Belém, criado no Egito e crescido em Nazaré, morreu o Autor da Vida. Sem que seus assassinos soubessem, sua morte acabou gerando vida. A vida, a vida eterna que pra muitos estava morta ganhou vida. O caminho outrora perdido foi de novo encontrado. Tudo por causa da morte de cruz do homem chamado Jesus.
Bruno Ramos
Isaías: 53. 4. "Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e carregou com as nossas dores; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. 5. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e esmagado por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. 6. Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, cada um se desviava pelo seu caminho; mas o Senhor fez cair sobre ele a iniqüidade de todos nós. 7. Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a boca; como um cordeiro que é levado ao matadouro, e como a ovelha que é muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a boca. 8. Pela opressão e pelo juízo foi arrebatado; e quem dentre os da sua geração considerou que ele fora cortado da terra dos viventes, ferido por causa da transgressão do meu povo? 9. E deram-lhe a sepultura com os ímpios, e com o rico na sua morte, embora nunca tivesse cometido injustiça, nem houvesse engano na sua boca. 10. Todavia, foi da vontade do Senhor esmagá-lo, fazendo-o enfermar; quando ele se puser como oferta pelo pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias, e a vontade do Senhor prosperará nas suas mãos. 11. Ele verá o fruto do trabalho da sua alma, e ficará satisfeito; com o seu conhecimento o meu servo justo justificará a muitos, e as iniqüidades deles levará sobre si. 12. Pelo que lhe darei o seu quinhão com os grandes, e com os poderosos repartirá ele o despojo; porquanto derramou a sua alma até a morte, e foi contado com os transgressores; mas ele levou sobre si o pecado de muitos, e pelos transgressores intercedeu."